quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Por uma Reforma Tributária Justa!


Do Tendências & Debates, da Folha.

Por uma reforma tributária justa

JOÃO PEDRO STEDILE, DEMÉTRIO VALENTINI, JOSÉ ANTÔ-

NIO MORONI e EMIR SADER

Defendemos que o "corte de gastos públicos" incida sobre o superávit
primário e o pagamento dos juros da dívida pública

AS CLASSES dominantes fizeram uma articulação e, por meio dos seus
parlamentares no Senado, conseguiram derrubar a CPMF (Contribuição
Provisória sobre Movimentação Financeira). Logo depois, aprovaram a
continuidade da DRU (Desvinculação de Receitas da União), que permite
o desvio de 20% da receita da União. Com isso, recursos podem ser
utilizados sem controle para o pagamento de juros, em vez de em
investimentos sociais.

A questão fundamental é que a CPMF era um imposto que taxava
principalmente os mais ricos -70% da sua arrecadação vinha de grandes
empresas e bancos. Além disso, impedia sonegação, fraudes e desvios.
Com a derrota no Senado, o governo federal tomou a iniciativa de
aumentar o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) e a CSLL
(Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) e retomou a cobrança do
imposto sobre as remessas de lucros para o exterior.

Essas propostas foram acertadas e justas, atingindo sobretudo os
bancos, o sistema financeiro e as empresas estrangeiras, apontando
para o combate à desigualdade social e para o desenvolvimento
nacional. Mais uma vez, as forças conservadoras se movimentaram e,
tendo à frente a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São
Paulo) e a Febraban (Federação Brasileira de Bancos), fizeram uma
campanha mentirosa contra as propostas do governo, com suporte da
Globo, dos Democratas e do PSDB.

De um lado, mentem quando afirmam que os mais pobres serão afetados
por esses impostos e, de outro, escondem que as taxas de juros
exorbitantes cobradas pelo sistema financeiro são o maior custo das
compras a prazo. Calam-se porque são beneficiados por esse
instrumento.

Diante disso, organizações populares e sindicais, intelectuais e
religiosos defendemos que o "corte de gastos públicos" exigido pelas
classes dominantes incida sobre o superávit primário e o pagamento dos
juros da dívida pública, que é a maior despesa do Orçamento da União
nos últimos dez anos.

Trata-se de uma transferência de dinheiro do povo para bancos e
especuladores. Em 2007, o governo federal gastou R$ 160,3 bilhões em
juros, valor correspondente a 6,3% do PIB (Produto Interno Bruto), que
representa quatro vezes o investimento nas áreas sociais. Precisamos
de uma verdadeira reforma tributária, que seja eficaz e progressiva,
incidindo proporcionalmente à renda e à riqueza. Atualmente, 70% dos
impostos são cobrados sobre o consumo e apenas 30% sobre o patrimônio.
É preciso diminuir o peso sobre a população e aumentá-lo sobre a
riqueza e a renda. Além disso, é fundamental a redução da taxa de
juros básica usada como referência para o pagamento dos títulos da
dívida pública com grupos financeiros.

Os bancos, por sua vez, deveriam baixar as escandalosas taxas de juros
cobradas dos consumidores e das empresas, que inviabilizam o crédito
para o crescimento do país.

Poderiam eliminar as taxas de serviços, que rendem por ano R$ 54
bilhões. Outra forma de aumentar a arrecadação sem prejudicar o povo
com cortes no

Orçamento é acabar com a Lei Kandir, que isenta do ICMS (Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços) as exportações agrícolas e
primárias,

prejudicando inclusive as contas dos Estados.

Por fim, necessitamos de uma política permanente de distribuição de
renda e, para isso, será necessário tomar medidas que taxem o
patrimônio, a renda e os privilégios dos 10% mais ricos, que se
apropriam de 75% da riqueza nacional. Só dessa forma poderemos
aumentar as oportunidades de emprego e renda e, sem reduzir a
contratação ou os salários dos servidores, ampliar os serviços
públicos de forma eficiente e gratuita para toda a população,
especialmente em saúde, educação e seguridade social. A sociedade
brasileira não pode se calar diante das pressões dos setores
conservadores e deve se manifestar, utilizando plebiscitos e consultas
como exercício do direito constitucional de decisão do povo sobre
assuntos tão importantes para a vida de todos e o futuro do país.

JOÃO PEDRO STEDILE, 52,

economista, é integrante da direção

nacional do MST (Movimento dos

Trabalhadores Rurais Sem Terra).

DOM DEMÉTRIO VALENTINI, 67, bispo de

Jales (SP), é membro da Comissão

Episcopal para o Serviço da Caridade, da

Justiça e da Paz, da CNBB.

JOSÉ

ANTÔNIO MORONI, 44, filósofo, é

membro do Inesc (Instituto de Estudos

Socioeconômicos) e diretor da Abong

(Associação Brasileira de ONGs).

EMIR

SADER, 67, sociólogo e cientista político,

é secretário-executivo da Clacso

(Conselho Latino-Americano de Ciências

Sociais) e professor da Uerj.

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