sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

A consolidação da decadência: o PT e o governo Roseana Sarney


30 DEZEMBRO 2010 SEM COMENTÁRIOS

Por Bruno Rogens*
Na foto Whasington, Roseana e Raimundo Monteiro
Concluída a composição do governo Roseana Sarney se confirma aquilo que alentávamos já em outros artigos. Consolida-se o processo de reestruturação do poder oligárquico no Maranhão sob a benção do Lulismo. Recairá sobre os ombros de historiadores a análise do significado político do apoio do talvez, maior presidente que o país já teve, à reestruturação da mais moribunda oligarquia política do país. Nem tudo serão flores para essa análise futura. O atual governo não difere em nada do que significou politicamente os 8 anos de governo Roseana na década de 90. Àquele tempo Roseana era filiada ao PFL e apoiava o governo tucano de Fernando Henrique Cardoso. O atual governo começa sob a hegemonia conservadora do DEM, do personalismo roseanista, do fisiologismo dos partidos nanicos, e do apoio oportunista à ocupante do Palácio do Planalto. A única diferença é a participação de Whashington Oliveira na cadeira de vice-governador.
Não se pode afirmar literalmente que o PT esteja no governo roseana. A grande maioia dos diretórios, das lideranças e dos militantes fizeram campanha para Flávio Dino do PC do B nas eleições de 2010. Whashington levou cartorialmente o PT do Maranhão ao rearranjo oligárquico sob a benção do Diretório Nacional do PT, do Lulismo e da presidente eleita Dilma, mas não sob a anuência de milhares e milhares de petistas maranhenses que não concordam em hipótese alguma com a rendição incondicional à oligarquia. Não há legitimidade sob a condição oficial da participação do partido no atual governo. Foram fundamentais para a consolidação da atual situação do partido no Maranhão os interesses nacionais e a fragilidade institucional do partido no Maranhão que ficou refém do personalismo de Whashington e das consequentes benesses do apoio à oligarquia.
Mas vejamos o que a CNB-Ma afirmava  por ocasião do PED de 2009:
Sobre a queda de Jackson lago: “O retorno da velha ordem, recebida melancolicamente e sem euforia pelo povo, bem como a queda do consórcio tucano-pedetista, também pelo povo não lamentada, configura o esgotamento dos dois projetos e o limiar da transição por que passa o Maranhão na busca do seu verdadeiro destino, à partir da exploração correta de suas possibilidades”.
Sobre a composição do governo Jackson: “Ainda que a formatação do governo sinalizasse a contradição entre a fala e a prática, haja vista os postos subalternos e periféricos reservados para a esquerda na estrutura de poder, (…)”
Essas são citações da tese da CNB-Ma inscrita no PED, e foi com essa tese que a CNB pediu votos e elegeu Raimundo Monteiro presidente estadual, que menos de um ano mais tarde posaria envergonhadamente na famosa entrega da camisa do PT à Roseana Sarney na briga pelo controle dos delegados petistas pela definição da posição do partido nas eleições. Interessante notar que a CNB-Ma falava em transição eesgotamento dos dois projetos em curso, o oligárquico e o pretensamente libertador jacksista e menos de um ano depois estava rasgando a tese, jogando-a no lixo, cometendo estelionato eleitoral com os eleitores do PED e fazendo envergonhadamente campanha para Roseana Sarney.
Para instigar o imaginação do leitor petista pergunto: por que a CNB-Ma fala em transição esgotamento do poder oligárquico e na campanha eleitoral faz campanha envergonhadamente para a oligarquia? Eles estavam lá a contragosto? À mando de quem eles faziam esse verdadeiro ato de traição aos ideais de fundação do PT e dos valores da esquerda? Amilhados agora na periferia da periferia do governo oligárquico o que Whashington Oliveira “vai contar lá em casa?” O pobre Maranhão vem pagando um alto preço pela governabilidade do projeto nacional.
A Articulação de Esquerda do Maranhão conclama a união das forças políticas do PT do Maranhão, incluindo valorosos companheiros da CNB-Ma para fazer oposição ao governo Roseana Sarney, para defender um PT vinculado aos movimentos sociais, populares, à intelectualidade engajada, à juventude de luta, para a construção de um polo político de esquerda no Estado que defenda o governo Dilma, o liberte das forças conservadoras da coalizão, e o faça avançar para a consecução de reformas estruturais fundamentais para a continuidade do projeto de mudanças iniciado sob o governo Lula.
*Bruno Rogens é professor e militante da Articulação de Esquerda no Maranhão

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Documentário mostra as reais intenções por detrás da perseguição ao Wikileaks



Descubra como o Wikileaks tornou-se um dos principais institutos de defesa pela verdade e pela justiça através dos vazamentos de informações secretas. Instalado nos servidores do Pirate Bay, o site está protegido pelas estritas leis suecas que protegem o direito de expressão.
Julian Assage, jovem ativista, que luta pela paz mundial, tornou-se uma das principais dores de cabeça dos EUA. Muitos políticos querem que ele seja preso ou executado, mas o que ele realmente fez de errado foi mostrar os meios imperialistas e desumanos que o país aplica.
O Wikileaks faz o papel que a mídia tradicional não faz justamente por esta estar ligada aos interesses políticos dos setores oligárquicos que ditam as regras mundias.
(docverdade)

Este vídeo, apresentado pela TV estatal sueca (SVT), relata a criação e revela o modo de agir do Wikileaks, esclarecendo em especial como opera sua rede de colaboradores. É permeado por excelentes entrevistas em que o fundador do site, Julian Assange, expõe o que o animou ao projeto.



www.outraspalavras.net

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Fórum Nacional pela reforma agrária e justiça no campo são contra a aprovação do novo código florestal


Fórum Nacional pela Reforma Agrária
                              e Justiça no Campo
                                                                                  Brasília-DF, 13 de dezembro de 2010

O Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo (FNRA) vem se posicionar contra a votação do Requerimento de Urgência, apresentado pela Bancada Ruralista, para que o relatório do Código Florestal possa entrar na pauta de votação da Câmara dos Deputados. O FNRA avalia que o citado relatório prejudicará milhares de produtores familiares e campesinos, estimulará o desmatamento florestal, comprometerá as fontes de água doce, degradará ainda mais o solo brasileiro e anistiará as empresas madeireiras, as mineradoras, as empresas de celulose, os pecuaristas e os monocultores de soja, entre outras atividades predadoras dos recursos naturais.
A Bancada Ruralista está fazendo qualquer negócio para dar satisfações aos financiadores de campanha. Haviam prometido que votariam o malfadado relatório do Código Florestal do deputado Aldo Rebelo (PCdoB/SP) e como não conseguiram estão apelando para aprovar um Requerimento de Urgência. Pressionam, ameaçam não votar os projetos da pauta mínima do governo e prometem apoiar o Líder do Governo, deputado Vaccarezza para presidente da Câmara.
Os ruralistas, espertamente, lançaram uma isca aos produtores e produtoras familiares e campesinas acenando com a dispensa de manter a área de Reserva Legal nas propriedades rurais com até quatro módulos fiscais. Esta proposta aposta na falta de informação do povo da terra, mas eles sabem que não é desmatando que se consegue maior produtividade. A agricultura familiar e camponesa produz mais por hectare que a patronal porque é diversificada, possui modo próprio de uso da terra e conserva os recursos naturais.
Os e as agricultoras sabem que a exclusão das várzeas do conceito de área de preservação permanente é uma atitude irresponsável que causará fome em milhares de família que vive da caça de caranguejo; que a redução de 30 metros para 15 metros da área de preservação mínima para rios, vai acelerar a poluição e a falta de água potável, vai sobrecarregar as mulheres ribeirinhas e indígenas; que a liberar o desmatamento dos cimos dos morros colocará em risco a vida dos que vivem nos vales, nos pés das encostas, pois estarão sempre ameaçados de desabamento.
A anistia das multas por desmatamentos ilegais e degradações ambientais ocorridos até julho de 2008 é uma forma de premiar os que não cumpriram a lei, incentivando condutas ilegais e penalizar os que agiram de licitamente. Um governo que se comprometeu com a comunidade internacional em diminuir a emissão de gás de efeito estufa nunca poderia ser omisso ou conivente com suas bases parlamentares que insistem em apoiar tamanho atentado ao meio ambiente nacional e do planeta.
Por esses motivos e pela falta de uma discussão democrática do relatório, que foi aprovado em uma Comissão Especial majoritariamente formada por membros da Bancada Ruralista, o FNRA vem a público manifestar o seu repúdio à proposta de votar um Requerimento de Urgência.
Conclama aos Deputados Federais que votem contra o requerimento a fim de se alinharem à posição das organizações e dos movimentos sociais e sindicais.

Atenciosamente,
Fórum Nacional pela Reforma agrária e Justiça no Campo





ABRA, ABEEF, APR, ABONG, ASPTA, ANDES, CARITAS - Brasileira; COIABE, Centro de Justiça Global, CESE, CIMI, CMP, CNASI, COIABE, CNBB, CONDSEF, CONIC, CONTAG, CPT, CUT, CTB,Comissão de Justiça e PAZ, DESER, Empório do Cerrado, ESPLAR, FASE, FAZER, FEAB, FETRAF, FIAN - Brasil, FISENGE, Grito dos Excluídos, IBASE, IBRADES, IDACO, IECLB, IFAS, INESC, Jubileu Sul/Brasil, MAB, MLST, MMC, MNDH, MPA, MST, MTL, Mutirão Nacional pela Superação da Miséria e da Fome; Pastorais Sociais, PJR, Rede Brasil, Rede Social de Justiça, RENAP, SINPAF, Terra de Direitos.



terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Internet e pós-capitalismo: muito além do Linux



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Entrevista:
MUITO ALÉM DO LINUX
Marcelo Branco, do Fórum Internacional do Software Livre, diz porque o evento incorporou temas como a liberdade na internet e fala da construção de uma nova agenda pós-capitalista
Por Antônio Martins
(Publicado em Retrato do Brasil, 09/2009)
Algo novo marcou a 10ª edição do Fórum Internacional de Software Livre (FISL) – um encontro que reúne todo os anos, em Porto Alegre, milhares de programadores, ativistas do universo Linux e estudantes. Entre 24 e 27 de junho, esse público assistiu, como de costume, a dezenas de palestras técnicas e lotou auditórios onde brilharam ícones da programação em código aberto, como Richard Stallman.
Mas as grandes atrações foram algo que transcende o mundo um tanto nerd dos criadores de softwares. Ninguém foi tão requisitado para falas, entrevistas e autógrafos quanto o sueco Peter Sunde, de 31 anos. Membro do coletivo Pirate Bay, bissexual e praticante do veganismo, ele é processado em seu país, num julgamento de repercussão internacional, por manter um dos sites de compartilhamento de música e vídeos mais populares da internet.
Também o tema que dominou os debates políticos no 10º FISL relaciona-se às novas formas de circulação do conhecimento e cultura. Inúmeras atividades debateram o projeto de lei por meio do qual o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) pretende monitorar e restringir a troca de conteúdos digitais pela rede. Presente ao ato que encerrou o Fórum, e visivelmente sensibilizado pelo evento, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva condenou de forma explícita a proposta.
O gaúcho Marcelo Branco é o personagem carismático que ajudou a articular, num único evento, temas que nem sempre andam juntos. Ele está ligado ao FISL desde seu início, em 2000. À época, respondia pela vice-presidência da empresa de processamento de dados do Rio Grande – a Procergs.
O ativismo de Branco vem de longe. Nos anos 1990, ele foi, como sindicalista, um dos líderes da luta contra a privatização da estatal brasileira de telecomunicações – a extinta Telebrás. Na última década, transitou entre Europa e Brasil, colaborou com Manuel Castells e ajudou a implantar políticas de difusão do software livre em diversos governos regionais espanhóis. No ano passado, assumiu a coordenação geral da Associação do Software Livre (ASL), a ONG que se tornou, desde 2002, responsável pela organização do FISL. Na entrevista a seguir, Branco expõe suas ideias sobre a emergência das redes e o futuro da internet e a necessidade de mantê-las sem vigilância.
Retrato do Brasil: Dez anos depois de ter ajudado a lançar o FISL1, você voltou a Porto Alegre para organizar a décima edição do evento. Qual o balanço dessa iniciativa?
Marcelo Branco: O FISL10 foi o maior e melhor de nossos fóruns. Reuniu cerca de 10 mil pessoas, que participaram de dezenas de conferências, com centenas de palestrantes, muitos deles internacionais. Politicamente, o ganho é maior. O evento marcou um momento de aglutinação das forças que, ao defender a liberdade na internet, procuram abrir espaço para formas livres e não-mercantis de circulação da informação, do conhecimento, dos bens culturais. Valorizou o software livre, mas foi além dele. Tratou de uma das disputas centrais na conjuntura crucial, e cheia de alternativas, que vivemos.
RB: Por que você vê a luta pela livre circulação de informações como algo tão central, politicamente?
MB: A possibilidade de desintermediar as relações sociais pode abrir uma nova etapa civilizatória – mas seu sentido ainda é incerto. Os espaços para a articulação direta entre os seres humanos, sem as condições, limites e barreiras impostos pelo capital, estão se multiplicando. Há muito tempo falávamos em associações produtivas diretas entre trabalhadores, mas não havia meios tecnológicos para fazê-lo com rapidez e em grande escala. Esses meios são oferecidos agora pela internet. A desnecessidade do capital aparece de forma ainda mais nítida em setores como a antiga indústria cultural, ou do copyright. Há alguns anos, uma banda de músicos que quisesse tornar-se conhecida precisava dos serviços de uma gravadora para ter acesso a estúdios, prensar discos, levá-los às lojas, fazer publicidade. Hoje, todos estes papéis podem (e são, em muitos casos) realizados pelos próprios músicos – inclusive porque a digitalização afundou os preços dos equipamentos. É um sintoma de relação social em que o capital está se tornando, simplesmente, obsoleto.
Porém, sozinhas, estas condições não asseguram o surgimento de uma sociedade melhor. A condição democrática não é algo explícito, ou necessário, na rede. A internet pode ser usada igualmente para controle social. É por isso que na disputa pelos rumos da rede tem enorme importância na própria definição dos sentidos do século XXI. Não por acaso, o tema central do FISL deste ano foi “Liberdade. Contra o controle e a vigilância na internet”.
RB: A tecnologia, por si mesma, nunca foi capaz de promover transformações sociais. Que disputas políticas se dão em torno destes desenvolvimentos técnicos?
MB: São batalhas de enorme intensidade. O capital investe em desespero contra compartilhamento de cultura e conhecimento – porque é algo que ameaça o território sagrado da propriedade privada. Milhares de pessoas, entre elas, crianças e adolescentes, são sendo processadas neste exato momento pela indústria fonográfica, por julgarem que tem direito de compartilhar bens culturais sem ter de pagar por isso. Se o movimento resiste e avança, é por expressar um direito do qual as pessoas não estão dispostas a abrir mão.
Os últimos anos foram marcados por enormes avanços democratizadores. Desde que a internet passou da fase pontocom para a 2.0, tem sucesso as iniciativas que promovem o compartilhamento, a desmercantilização, a colaboração. Estamos vivendo o início da época das redes sociais, que multiplica a potência e autonomia dos grupos articulados e capazes de gerar inteligência coletiva. Há cerca de um ano, no entanto, começou um contra-ataque. Alguns de seus símbolos são a lei de restrição à internet na França, aprovada por proposta e pressão do governo Sarkozy, mas derrubada em seguida pelo tribunal constitucional; o processo contra o grupo sueco Pirate Bay, cujo site facilita a troca de arquivos digitalizados; e, no Brasil, o projeto de lei do senador Eduardo Azeredo, que, a pretexto de combater a pedofilia e os crimes bancários, permite criminalizar o compartilhamento de cultura e conhecimento.
É um ataque violento e combinado. Nele, estão envolvidos três agentes fundamentais. Um são as empresas dominantes em setores onde o capital está se tornando rapidamente obsoleto, como a indústria fonográfica e cinematográfica. Outro é o dos segmentos dos Estados mais ligados à repressão, controle social e vigilância. São eles que procuram associar troca de arquivos digitais com “terrorismo”. Fato emblemático: a Convenção de Budapeste, onde se armou a ofensiva desencadeada agora contra a liberdade na rede, foi firmada dois meses após os atentados de 11 de setembro de 2001, num momento político marcado pelo medo. O Brasil não está entre os cerca de 40 países signatários. Por último, a velha mídia, que ideologicamente não consegue conceber relações sociais pós-capitalistas, e cujos interesses oligopolítisticos são diretamente afetados pela emergência da blogosfera.
RB: Neste cenário, qual a importância do discurso em que Lula condenou, no ato de encerramento do FISL, o projeto Azeredo?
MB: Compartilho de todas as análises que ressaltam as ambiguidades decorrentes do caráter heterogêneo do governo Lula. Mas a sensibilidade do presidente para a mobilização social é algo que deve fazer parte de nossas equações políticas. No FISL, ele sentiu claramente o clima. Lula encampou a luta da sociedade civil, resolvendo a contradição que persistia no governo, até há pouco. A Polícia Federal esteve sempre ao lado do projeto Azeredo. O Ministério da Justiça abriu canais de diálogo, mas tentava uma conciliação impossível.
Esse gesto tornou-se viável, também, porque a própria sociedade civil combinou intransigência na defesa dos direitos com equilíbrio. Não somos contra a existência de leis para regular a internet, nem a favor de complacência com os crimes digitais. Propomos que o Estado participe das regulações necessárias ao fluxo das relações no mundo digital. Mas queremos que isso se dê não a partir do prisma da repressão – como ocorre na proposta do senador Azeredo – mas dos direitos. Foi isso o que o presidente propôs ao ministro Tarso Genro, durante o FISL, numa reunião conjunta entre membros do governo e da sociedade civil. É uma postura que coloca o Brasil em posição de vanguarda.
RB: Por que, além da direita, certos setores da esquerda parecem desconcertados, diante da emergência de relações que permitem a desintermediação?
MB: Vivemos uma transição delicada. As novas tecnologias criam condições para desintermediar também as relações políticas. Não quero fazer projeções para o futuro, mas observo que, hoje, defender uma causa qualquer é uma opção que dispensa adesão a um partido político. Novas redes de mobilização social, em favor de objetivos específicos, vão se multiplicando a cada instante.
Ao contrário do que sustenta a crítica conservadora, elas não são apenas virtuais. Produzem efeitos concretos, dos quais há exemplos abundantes: a campanha contra a lei Azeredo; a derrubada do governo Aznar, em 2004, na Espanha; a denúncia da invasão do Líbano por Israel, em 2006; a avalanche em favor de Barack Obama; a persistente mobilização dos iranianos contra o fundamentalismo do governo Ahminejad.
No universo político e sindical da esquerda, muitos resistem a compreender essa transformação. Essa resistência conservadora está na origem das críticas endereçadas a novidades políticas como o Fórum Social Mundial.
O curioso é que as redes provocam desorientação semelhante também no terreno do capital. Grandes empresas (como a Google) nascem e se agigantam num piscar de olhos, porque são sensíveis ao desejo de comunicação e des-hierarquização presente na sociedade. Outras vão se adaptando à mudança. Oracle, Sun, UOL e Itautec estão presentes e atuantes no FISL10. Mas setores como a indústria do copyleft atacam com virulência a nova lógica.
RB: Um dos desdobramentos principais da internet se dá na mídia. Que perspectivas você vê para a Conferência Nacional de Comunicações, convocada para dezembro próximo?
MB: Estou muito preocupado: temo que corremos o risco de perder uma grande oportunidade. Em relação à conferência, penso que duas posturas são ineficazes ou insuficientes. A primeira é denunciar o conteúdo da mídia de massas (como se fosse possível esperar dela profundidade ou posturas democráticas). A segunda é supervalorizar as concessões públicas do espaço radioelétrico, hoje dominadas por alguns grandes grupos, em associação com famílias oligárquicas ou caciques políticos regionais. Esses pontos, de enorme importância no século passado, estão perdendo sentido aceleradamente. Se até os grupos de mídia mais contemporâneos e especialmente o público estão migrando para a internet, que efeito terá, em dez ou quinze anos, redistribuir os canais de rádio ou as estações de TV?
Enxergo uma agenda alternativa. Nela, as batalhas que marcaram a luta pela democracia midiática nas décadas anteriores não desaparecem. Mas o centro da disputa migra para a difusão da cultura digital. Livre circulação de conhecimento e bens imateriais na rede. Acesso público e gratuito à internet, em banda larga. Formação conceitual, técnica e tecnológica para uso das novas mídias. Políticas públicas novas, para realidades, demandas e desejos inéditos.
LEIA MAIS:
Para conhecer em detalhes a programação do FISL, um curioso amálgama de atividades técnicas e políticas, visite http://www.fisl.org.br/10/www/festival-de-cultura-livre
O Pirate Bay, considerado por muitos o mais popular site de compartilhamento de música, vídeos e outros conteúdos digitais da atualidade, pode ser encontrado em http://thepiratebay.org
Uma excelente fonte de informações sobre o projeto do senador Eduardo Azeredo, para controle e vigilância da internet, é o blog coletivo Trezentos (http://www.trezentos.blog.br), em especial no espaço de Sérgio Amadeu: (http://www.trezentos.blog.br/?author=1)
O vídeo do ato de encerramento do FISL, com o discurso em que Lula rejeita o projeto de lei do senador Eduardo Azeredo está em http://www.youtube.com/watch?v=QBE1Ux-saqA

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

A revolução dos Wikis chega ao jornalismo

Por dentro do Wikileaks: a democracia passa pela transparência radical
publicado em 01/12/2010

Por Natália Viana
Fonte Opera Mundi, em 30/11/2010
Fui convidada por Julian Assange e sua equipe para trazer ao público brasileiro os documentos que interessam ao nosso país. Para esse fim, o Wikileaks decidiu elaborar conteúdo próprio também em português. Todos os dias haverá no site matérias fresquinhas sobre os documentos da embaixada e consulados norte-americanos no Brasil.

Por trás dessa nova experiência está a vontade de democratizar ainda mais o acesso à informação. O Wikileaks quer ter um canal direto de comunicação com os internautas brasileiros, um dos maiores grupos do mundo, e com os ativistas no Brasil que lutam pela liberdade de imprensa e de informação. Nada mais apropriado para um ano em que a liberdade de informação dominou boa parte da pauta da campanha eleitoral.

Buscando jornalistas independentes, Assange busca furar o cerco de imprensa internacional e da maneira como ela acabada dominando a interpretação que o público vai dar aos documentos. Por isso, além dos cinco grandes jornais estrangeiros, somou-se ao projeto um grupo de jornalistas independentes. Numa próxima etapa, o Wikileaks vai começar a distribuir os documentos para veículos de imprensa e mídia nas mais diversas partes do mundo.

Assange e seu grupo perceberam que a maneira concentrada como as notícias são geradas – no nosso caso, a maior parte das vezes, apenas traduzindo o que as grandes agências escrevem – leva um determinado ângulo a ser reproduzido ao infinito. Não é assim que esses documentos merecem ser tratados: “São a coisa mais importante que eu já vi”, disse ele.

Não foi fácil. O Wikileaks já é conhecido por misturar técnicas de hackers para manter o anonimato das fontes, preservar a segurança das informações e se defender dos inevitáveis ataques virtuais de agências de segurança do mundo todo.

Assange e sua equipe precisam usar mensagens criptografadas e fazer ligações redirecionados para diferentes países que evitam o rastreamento. Os documentos são tão preciosos que qualquer um que tem acesso a eles tem de passar por um rígido controle de segurança. Além disso, Assange está sendo investigado por dois governos e tem um mandado de segurança internacional contra si por crimes sexuais na Suécia. Isso significou que Assange e sua equipe precisam ficar isolados enquanto lidam com o material. Uma verdadeira operação secreta.

Documentos sobre Brasil

No caso brasileiro, os documentos são riquíssimos. São 2.855 no total, sendo 1.947 da embaixada em Brasília, 12 do Consulado em Recife, 119 no Rio de Janeiro e 777 em São Paulo.

Nas próximas semanas, eles vão mostrar ao público brasileiro histórias pouco conhecidas de negociações do governo por debaixo do pano, informantes que costumam visitar a embaixada norte-americana, propostas de acordo contra vizinhos, o trabalho de lobby na venda dos caças para a Força Aérea Brasileira e de empresas de segurança e petróleo.

O Wikileaks vai publicar muitas dessas histórias a partir do seu próprio julgamento editorial. Também vai se aliar a veículos nacionais para conseguir seu objetivo – espalhar ao máximo essa informação. Assim, o público brasileiro vai ter uma oportunidade única: vai poder ver ao mesmo tempo como a mesma história exclusiva é relatada por um grande jornal e pelo Wikileaks. Além disso, todos os dias os documentos serão liberados no site do Wikileaks. Isso significa que todos os outros veículos e os próprios internautas, bloggers, jornalistas independentes vão poder fazer suas próprias reportagens. Democracia radical – também no jornalismo.

Impressões

A reação desesperada da Casa Branca ao vazamento mostra que os Estados Unidos erraram na sua política mundial – e sabem disso. Hillary Clinton ligou pessoalmente para diversos governos, inclusive o chinês, para pedir desculpas antecipadamente pelo que viria. Para muitos, não explicou direto do que se tratava, para outros narrou as histórias mais cabeludas que podiam constar nos 251 mil telegramas de embaixadas.

Ainda assim, não conseguiu frear o impacto do vazamento. O conteúdo dos telegramas é tão importante que nem o gerenciamento de crise de Washington nem a condenação do lançamento por regimes em todo o mundo – da Austrália ao Irã – vai conseguir reduzir o choque.

Como disse um internauta, Wikileaks é o que acontece quando a superpotência mundial é obrigada a passar por uma revista completa dessas de aeroporto. O que mais surpreende é que se trata de material de rotina, corriqueiro, do leva-e-traz da diplomacia dos EUA. Como diz Assange, eles mostram “como o mundo funciona”.

O Wikileaks tem causado tanto furor porque defende uma ideia simples: toda informação relevante deve ser distribuída. Talvez por isso os governos e poderes atuais não saibam direito como lidar com ele. Assange já foi taxado de espião, terrorista, criminoso. Outro dia, foi chamado até de pedófilo.

Wikileaks e o grupo e colaboradores que se reuniu para essa empreitada acreditam que injustiça em qualquer lugar é injustiça em todo lugar. E que, com a ajuda da internet, é possível levar a democracia a um patamar nunca imaginado, em que todo e qualquer poder tem de estar preparado para prestar contas sobre seus atos.

O que Assange traz de novo é a defesa radical da transparência. O raciocínio do grupo de jornalistas investigativos que se reúne em torno do projeto é que, se algum governo ou poder fez algo de que deveria se envergonhar, então o público deve saber. Não cabe aos governos, às assessorias de imprensa ou aos jornalistas esconder essa ou aquela informação por considerar que ela “pode gerar insegurança” ou “atrapalhar o andamento das coisas”. A imprensa simplesmente não tem esse direito.

É por isso que, enquanto o Wikileaks é chamado de “irresponsável”, “ativista”, “antiamericano” e Assange é perseguido, os cinco principais jornais do mundo que se associaram ao lançamento do Cablegate continuam sendo vistos como exemplos de bom jornalismo – objetivo, equilibrado, responsável e imparcial.

Uma ironia e tanto.

*Natália Viana é jornalista e colaboradora do Opera Mundi