terça-feira, 23 de novembro de 2010

Livro da Editora UFMG resgata história da luta de Manoel da Conceição pelo direito à terra


 por Itamar Rigueira Jr.

Manoel da Conceição: socialista radical que soube reorientar sua atuação política
A história de Manoel da Conceição, líder das lutas pelo direito à terra no Maranhão, preso e exilado nos anos 1970 e que voltou a sua terra natal em busca dos antigos sonhos, é tema do livro Chão de minha utopia, recém-lançado pela Editora UFMG. A obra resgata depoimento de 1979, dado no exílio em Paris, e mostra também o pensamento e as ações de Mané – como ele gosta de ser chamado – nos últimos tempos.
A socióloga Ana Galano, militante da Ação Popular e também exilada, gravou 20 horas de entrevista com Manoel da Conceição, reproduzida na época na obra Essa terra é nossa – Depoimento sobre a vida e as lutas de camponeses no estado do Maranhão, lançada na França. Em 2007, as pesquisadoras Paula Elise Ferreira Soares e Delsy Gonçalves de Paula foram ao Maranhão conhecer o trabalho do líder. Paula Elise é organizadora do livro ao lado de Wilkie Buzatti Antunes – ambos mestrandos em História pela UFMG e pesquisadores do Projeto República, responsável pela publicação, juntamente com o Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural (Nead) do Ministério do Desenvolvimento Agrário.
Um dos objetivos centrais do livro, segundo os organizadores, é registrar as histórias do campo, que ainda seriam pouco conhecidas. “Pretendemos trazer a questão agrária de volta para o meio acadêmico, e esta é uma tentativa de não perder a história, renovando as denúncias sobre o que aconteceu no campo nas décadas de 60 e 70”, afirma Paula Elise Soares.

Solidariedade

Depois da infância passada em Santa Luzia, próximo a Copaíba, no interior do Maranhão, Mané teve adolescência marcada pela religiosidade e pelas expulsões de terras. Daí, enveredou na luta pela reforma agrária e pelo socialismo. Os conflitos que marcaram sua militância ocorreram primeiramente no Vale do Pindaré-Mirim. Perdeu uma perna atingida por tiros de policiais durante invasão do sindicato que presidia. Filiou-se ao Movimento de Educação de Base (MEB) e à Ação Popular (AP), o que ajudou a domar a ânsia de se vingar dos proprietários de terra e a valorizar a educação como forma de politização dos trabalhadores rurais. Foi preso várias vezes, torturado, solto e exilado com apoio de organizações estrangeiras.
Anistiado, Manoel voltou ao Brasil em 1979 e ajudou a fundar o PT e chegou a se candidatar ao governo de Pernambuco e a senador pelo Maranhão, duas incursões que ele considerou malsucedidas. “Eu não sei disputar votos porque não consigo mentir”, disse certa vez.
Ele ajudou a criar o Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural (Centru), em 1984, com o objetivo de capacitar militantes de sindicatos, associações e partidos, e auxiliou movimentos rurais em campanhas de ocupação de terras. No assentamento Nova Descoberta, ele ajudou a construir experiência inédita, de uso comum de grande extensão de terra aliado à exploração individual de terrenos menores.
“Toda a luta do Mané foi baseada no desejo de solidariedade e união entre os homens, que para ele é o que há de comum na religião e na política”, conta Paula Elise Soares. Ela destaca que o líder foi um socialista radical, mas que soube “reelaborar suas ideias e reorientar suas ações na busca de outro caminho e outra estrutura política”, o que inclui a defesa do desenvolvimento sustentável. Segundo a pesquisadora, ele tem muito clara a intenção de deixar registros sobre sua trajetória, “também como forma de ressignificar suas experiências”.
Em palestra recente para universitários no Maranhão, reproduzida no final do livro, Manoel da Conceição defende o “empoderamento coletivo” dos trabalhadores. Além das terras para produzir, ele reivindica o acesso aos meios de comunicação e ao conhecimento científico e tecnológico. “A gente quer aprender a produzir com qualidade e quantidade. A gente quer a saúde para cada um que se alimenta com o que nós produzimos”, ele disse.

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