quarta-feira, 16 de maio de 2012

O Conluio entre Prefeitura, Justiça do Trabalho, empresários do transporte coletivo e motoristas e cobradores de ônibus em desfavor ao direito de ir e vir em São Luís


Por Bruno Rogens
Mais uma vez São Luís dá mostras de que anda na contramão do que acontece no Brasil dos últimos anos. A capital do Estado do Maranhão se tornou uma cidade com mais de 1 milhão de habitantes mas ainda está longe de poder ser considerada uma metrópole. Os diversos problemas estruturais da cidade vêm se acumulando e ameaçam deixar a cidade em colapso urbano em plena nas comemorações dos 400 anos de fundação. Só para citar é preciso dizer que a cidade ainda sofre um crônico problema de abastecimento de água potável à seus cidadãos. É importante deixar claro que os dois maiores responsáveis pelo acúmulo de problemas da cidade chamam-se Tadeu Palácio (ex-PDT, hoje PP) e João Castelo (PSDB), respectivamente ex-prefeito e prefeito da cidade, além do grupo Sarney que “comanda” o Estado há quase meio século. Tadeu Palácio governou a cidade por 8 anos quando os problemas estruturais de trânsito por exemplo começavam à incomodar e poderiam ter sido amenizados ou resolvidos. João Castelo está no último ano do mandato e simplesmente não fez nada de significativo nestes 3 anos de (des)governo. Agora às vésperas das eleições tenta maquiar os problemas estruturais de trânsito, por exemplo, aplicando uma nova camada asfáltica e pintando meios-fios das principais avenidas. Como se não bastasse, comete o impropério de prometer até outubro a entrega de linhas do chamado Veículo leve sobre trilhos-VLT ligando o Centro ao São Cristóvão. Haja cara de pau.

Para piorar a lambança, agora entra em cena a teatral e esperada greve dos motoristas e cobradores de ônibus, em um enredo que está ficando enfadonho, se não fosse trágico, para os usuários do transporte coletivo da cidade, na sua grande maioria humildes trabalhadores e trabalhadoras. O enredo é conhecido. A categoria dos rodoviários faz uma greve de advertência e reivindica melhorias salariais. Os donos de empresas de transporte coletivo respondem dizendo que não podem dar aumento salarial devido ao saturamento da folha de gastos das empresas e pela iminência da falência do sistema de transporte. O medo e a chantagem pairam na cabeça dos acomodados usuários de transporte coletivo da cidade com medo de não ir ao trabalho e ter o salário descontado ou mesmo perder o emprego. A justiça do trabalho acompanha tudo e se arvora árbitra legítima do litígio. O prefeito João Castelo observa tudo do alto das confortáveis sala do palácio de La Ravardiere. Motoristas e cobradores decretam a greve. A justiça decreta a circulação de uma percentagem de coletivos para evitar o caos generalizado. Os dias passam. O impasse se acirra, a situação nas ruas fica mais tensa. A polícia, como sempre, é eficiente e ágil quando se trata de defender a propriedade dos poderosos. E a mágica e fantástica solução encontrada por todos esses agentes em disputa é: aumentar a passagem dos coletivos na cidade.

O conluio entre Prefeitura, Justiça do Trabalho, motoristas e cobradores, e empresários dos transportes só não tem a participação do povo trabalhador e usuário de transporte coletivo da cidade de São Luís, que nunca é ouvido nas mesas de negociação sobre as condições do seu constitucional direito de ir em vir com dignidade. Aliás, a resposta que os usuários de transporte vêm dando ao caos instalado no sistema de transporte urbano é mais caos, vide as recentes manifestações nos terminais de integração da Cohama, Praia Grande e São Cristóvão. E o resultado é que o usuário de transporte coletivo em São Luís sai duplamente punido: primeira pela vergonhosa qualidade do sistema de transporte público da capital e segundo pelo aumento da passagem que visa garantir: mais impostos para a prefeitura, mais salário para os motoristas e cobradores e mais lucro para os empresários do transporte. E assim seguem felizes políticos, financiadores de campanha e burocratas do judiciário, enquanto a população segue oprimida por um sistema vergonhoso de transporte.

A falta de espírito público e a inanição da sociedade civil em reivindicar melhorias do sistema de transporte público da capital é uma especificidade maranhense. Não que não existam espertalhões e povo apático em outras cidades do Brasil mas aqui essa apatia e falta de compreensão do seu papel como cidadão assumem contornos singulares, fruto dos anos de uma cultura política predatória e patrimonial, sobretudo da classe política que é muito competente em desviar milhões para seus negócios pessoais e incompetentes em prover, por exemplo, aulas regulares para as crianças de São Luís. Em outras paragens temos uma situação, que não é a ideal, mas que revela avanços do ponto de vista da gestão do sistema de transporte público. Vejamos o caso de Fortaleza.

Em Fortaleza as concessões estabelecem um sistema de remuneração das empresas por quilometro rodado e não por passageiro transportado. Esse sistema permite que as tarifas da cidade sejam uma das mais baratas do país considerando as distâncias percorridas pelas linhas de ônibus. A passagem custa R$ 2,00. A meia passagem de R$ 1,00 é ilimitada a qualquer estudante com carteira emitida pelas entidades estudantis com base no cadastro das escolas. Nas escolas públicas e nos casos de alunos do PROUNI a prefeitura paga a confecção das carteiras e os alunos à recebem gratuitamente. Aos domingos há a tarifa social de R$1,40 para todos com a meia passagem de R$ 0,70 para estudantes com a carteira. Existe também a hora social em que, fora dos horários de pico o usuário do transporte coletivo paga somente R$1,80 e a meia à R$0,90. A frota dos ônibus de Fortaleza tem média de menos de 5 anos e a prefeitura está providenciando corredores exclusivos nas principais avenidas da cidade. Além disso a cidade ainda contará em breve o Veículo leve sobre trilho, obra que já está em andamento. Em Fortaleza Liziane Lins (PT) está encerrando o seu segundo mandato e à se contar pelas políticas de transporte público implantadas acredito que o povo de Fortaleza vai querer continuar nesse rumo.

Enquanto o cenário eleitoral que se avizinha em São Luís dá sinais de que o eleitor não terá muitas boas escolhas a fazer nas eleições de outubro a cidade praticamente agoniza com problemas estruturais em quase todas as áreas. Situação agravada pelo explícito e asqueroso conluio entre detentores de mandatos públicos, agentes do judiciário que sempre julgam em favor dos poderosos, empresários do setor de transporte, e a mesquinhez dos interesses corporativistas da categoria dos trabalhadores em transporte que não exitam em punir a população na busca dos seus, legítimos, diga-se de passagem, direito à melhor remuneração. Nesse enrendo sombrio que precede as comemorações pelos tão propalados 400 anos da cidade só quem se dá mal é o povo.

Bruno Rogens
Cientista Social, professor de Sociologia e Ciência Política

Nenhum comentário: